Com o voto de desempate da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, a corte definiu que a adoção de medidas cautelares que restrinjam a atuação de um parlamentar, como o afastamento dele de suas atividades legislativas, precisa do aval da Câmara dos Deputados ou do Senado.
General view of a session of the Supreme Court to decide
whether judge Edson Fachin continues as rapporteur for JBS and can approve
ratification agreements, in Brasilia, Brazil June 22, 2017. REUTERS/Ueslei
Marcelino. Foto: Reuters
Cármen deu o sexto e decisivo voto a favor de que a
decretação pelo Supremo desse tipo de cautelar contra deputado e senador tem de
ser submetida à autorização posterior da respectiva Casa Legislativa.
Na sexta-feira passada, reportagem da Reuters havia antecipado
que essa seria a tendência que iria prevalecer no julgamento.
A posição da presidente do Supremo, uma espécie de voto
intermediário, terá repercussão direta no caso do senador Aécio Neves
(PSDB-MG). O tucano foi afastado pela segunda vez este ano das suas atividades,
a mais recente delas por decisão da Primeira Turma do STF.
Cármen Lúcia articulou pessoalmente uma solução a fim de
diminuir a tensão entre o Judiciário e o Senado, tendo conversado com o
presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e colocado em pauta o
julgamento desta quarta. O Senado marcou uma sessão para a próxima terça-feira,
dia 17, a fim de decidir se revoga a decisão da Turma do Supremo que afastou
Aécio.
O STF julgou uma ação movida por PP, PSC e Solidariedade que
pretendiam garantir que medidas cautelares do Supremo têm de ser enviadas para
a Câmara ou Senado a fim de que eles decidam em até 24 horas sobre a sua
aplicação, nos mesmos moldes do que prevê a Constituição para o caso de prisão
em flagrante de parlamentar por crime inafiançável.
Inaplicável
No início do julgamento, o relator da ação, ministro Edson
Fachin, havia votado contra a necessidade de o STF precisar de uma autorização
posterior para a validade de medidas cautelares contra parlamentares.
Para Fachin, é "evidentemente inaplicável"
qualquer submissão de uma decisão cautelar do Judiciário ao crivo do Poder
Legislativo. Isso significaria, destacou, uma indevida ampliação da imunidade
do parlamentar, interferindo na independência do Judiciário.
"Estender essa competência para permitir a revisão, por
parte do Poder Legislativo, das decisões jurisdicionais sobre medidas
cautelares penais, significa ampliar referida imunidade para além dos limites
da própria normatividade que lhe é própria, em ofensa ao postulado republicano
e à própria independência do Poder Judiciário", afirmou o relator, em seu
voto.
Primeiro a votar após o relator, contudo, o ministro
Alexandre de Moraes divergiu de Fachin e votou a favor de que cabe à Câmara e
ao Senado decidir se concorda com a adoção da medida cautelar.
Em seu longo voto, Moraes fez uma digressão histórica para
destacar que a imunidade é uma prerrogativa que existe há mais de 400 anos para
impedir qualquer tipo de restrição à atividade do parlamentar.
Para ele, o Supremo tem de se preocupar com a defesa da
separação de Poderes e suas prerrogativas, mesmo diante das críticas da
população em geral contra a atuação do Congresso.
"No momento em que vive o Parlamento brasileiro, no
gravíssimo momento, com inúmeros deputados e senadores sendo investigados,
processados, perdendo mandato, com a população corretamente desgostosa com a
atuação parlamentar, nesse momento mais ainda que esta Casa, o Supremo Tribunal
Federal, se preocupar com o continenti e não com o conteúdo", destacou.
Os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar
Mendes, Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia acompanharam-no. Toffoli, por
exemplo, defendeu que nesses casos o ato emanado do Poder Judiciário deverá ser
submetido ao controle político da Casa Legislativa.
"O Supremo Tribunal Federal não pode atuar como
fomentador de tensões institucionais, porque, a meu ver, viria a ocorrer caso
se suprimisse do poder Legislativo o legítimo controle de medidas",
avaliou.
Olimpo
No voto decisivo, Cármen Lúcia afirmou que não se trata de
um desrespeito a submissão de uma medida cautelar que restringe a atuação do
parlamentar à respectiva Casa Legislativa. Para ela, contra uma decisão
judicial cabem recursos, mas não desacatos.
"Todos os Poderes atuam livre e igualmente e é dessa
harmonia que podemos ter essa condição de uma democracia. Qualquer
interpretação de que um dos Poderes possa atuar desconhecendo a atuação do
outro é uma interpretação equivocada", disse.
"Estamos falando de um Estado e não um olimpo, nenhum
poder está acima dos outros", completou.
terra.com.br/noticias
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